Uma Carta Pessoal - Uma exposição da carta de Paulo a Filemon




Uma exposição da carta de Paulo a Filemon



Texto Básico: “Filemon”
Palavra Chave: Fm 21. Escrevo-te confiado na tua obediência, sabendo que farás ainda mais do que peço.

Introdução: Paulo escreveu sua carta a Filemom por ocasião de sua prisão domiciliar em Roma, no ano 60 ou 61.

Filemom é uma carta pessoal, na qual Paulo escreve a um amigo para lhe pedir que seja leniente com um escravo fujão, Onésimo. Pela lei romana, Filemom tinha o direito de punir Onésimo com a severidade que desejasse, até mesmo com morte, mas Paulo queria que Filemom não apenas perdoasse Onésimo, como também lhe garantisse a alforria (v.14-16;). Paulo ainda não havia visitado Colossos, mas parece ter sido responsável pela conversão de Filemom (v.19 Eu, Paulo, de meu próprio punho o escrevo: Eu o pagarei; pois, não te digo como também tu me deves até a ti mesmo). Onésimo, aparentemente, roubara Filemom e fugira para Roma, onde encontrou Paulo, confessou seu crime e se converteu.

Cerca um terço da população romana do primeiro século era constituída por escravos (v. 12 eu to torno a enviar, a ele que é o meu próprio coração).
0 escravo não tinha amparo legal, e um fugitivo poderia ser punido com extrema severidade: marcado no rosto, acorrentado, forçado a usar um colar de ferro ou condenado à invalidez depois de ter as pemas quebradas. 0 escravo podia ainda ser vendido para trabalhar nas minas ou ser sentenciado à morte (v.14 mas sem o teu consentimento nada quis fazer, para que o teu benefício não fosse como por força, mas, sim, espontâneo).
0 historiador aristocrático Salústio descreve a Roma da época de Paulo como “o esgoto do mundo” (v.24 assim como Marcos, Aristarco, Demas e Lucas, meus cooperadores).

1. O Escritor (1) Em Colossenses, Paulo se chama “apóstolo” (Cl 1.1Paulo, apóstolo de Cristo Jesus pela vontade de Deus, e o irmão Timóteo,); aqui ele declara que é prisioneiro de Jesus Cristo. Ele está preso a Cristo por fé e compromisso, e também preso numa prisão romana por crer em Jesus Cristo e lhe ser leal (At 28.30 E morou dois anos inteiros na casa que alugara, e recebia a todos os que o visitavam,). Prisioneiro indica as condições adversas sob as quais ele trabalha. Levando em conta o propósito da carta — inspirar graça e perdão no amado Filemom por Onésimo —, as circunstâncias deploráveis de Paulo tornam as dificuldades de Filemom como nada. Timóteo, como em Colossenses, faz parte dos remetentes destes sentimentos e pedidos. Ele é irmão de Paulo, espiritualmente falando.

2. Os Destinatários (1,2) A carta é endereçada primariamente ao amado Filemom (1). Esta palavra graciosa (amado) é reservada para os companheiros mais queridos de Paulo (cf. 2 Tm 1.2). Este homem também é um dos cooperadores de Paulo na pregação e promoção da obra de Cristo. Embora a carta seja pessoal e endereçada a Filemom, também é endereçada à igreja (v.2 e à nossa irmã Áfia, e a Arquipo, nosso companheiro de lutas, e à igreja que está em tua casa:), porque o problema é tanto público quanto privado. Entre os destinatários está Afia, que é irmã, mas não “amada”. Os comentaristas sugerem que ela é esposa de Filemom, mas não há como ter certeza; pelo menos, é irmã em Cristo. Roberts ressalta que a palavra nosso não ocorre no texto grego Arquipo é chamado companheiro ou “companheiro de lutas” no serviço a Cristo. Knox propõe que ele, e não Filemom, era o pastor da igreja colossense (Cl 4.16,17).

E à igreja que está em tua casa (2) revela que a casa de Filemom era lugar de reunião para o culto a Deus usada pelos crentes colossenses (Cl 4.8,9). A igreja em Laodicéia se reunia na casa de Ninfa (Cl 4.15). Muito pouco é dito sobre Hierápolis, a terceira cidade em importância no vale do Lico. E provável que a cidade não tivesse igreja organizada, embora sua menção dê a entender que alguns crentes morassem ali.

3. As Saudações (v.3 Graça a vós, e paz da parte de Deus nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo) A carta contém a bem conhecida saudação paulina graça... e paz. O apóstolo declara que elas virtudes veem divinamente do Pai e do Filho, o Senhor Jesus Cristo. O Espírito Santo não é mencionado nesta breve epístola.

1. O Motivo da Oração (4,5 Sempre dou graças ao meu Deus, lembrando-me de ti nas minhas orações, 5 ao ouvir falar do amor e da fé que tens para com o Senhor Jesus e para com todos os santos;) Paulo é mestre em psicologia. E sua característica preparar adequadamente o terreno antes de plantar a semente (At 26.2. Sinto-me feliz, ó rei Agripa, em poder defender-me hoje perante ti de todas as coisas de que sou acusado pelos judeus;). Ele observa e recomenda as coisas boas antes de aplicar as palavras de correção ou repreensão. O louvor está caracteristicamente na boca do apóstolo com as palavras: Graças dou ao meu Deus (4).

De acordo com a gramática grega, Paulo agradece a Deus sempre e não ora sempre. Eis a tradução correta: “Sempre dou graças a meu Deus” ). A razão para o louvor de Paulo são a caridade o “amor”, e a fé de Filemom (5). O amor e a fé são graças cristãs manifestas primeiro para com o Senhor Jesus Cristo (vertical) e depois para com todos os santos (horizontal).

A sequência é especialmente significativa para esta epístola, porque não há relação humana apropriada a menos que primeiro haja uma relação certa com Deus (a ordem na NVI é inadequada).

2. O Propósito da Oração (6,7) O propósito das orações de Paulo é a comunicação (compartilhamento, “comunhão”) da fé de Filemom (v.6). A palavra grega koinonia (comunicação), significa a comunhão entre os crentes (1 Co 1.9; G1 2.9; Fp 1.5).

Em 1 Coríntios 10.16, essa palavra é usada com relação à Ceia do Senhor, a refeição comunial. O objetivo de Paulo em orar por Filemom é que sua fé seja eficaz, quer dizer, que tenha o poder de realizar o fim que Paulo tem em mira (Cl 3.17). Este fim é a aceitação de que todo o bem esteja em Cristo Jesus. A palavra Jesus não consta em certos manuscritos v. 7. O fraseado deste versículo recorda a origem e o fim de toda conduta ética, conforme está revelada em Colossenses 3.17,23.8.

O resultado dessa experiência em Filemom é que, onde quer que ele vá, sua presença e espírito causem um efeito salutar (v.7 Pois tive grande gozo e consolação no teu amor, porque por ti, irmão, os corações dos santos têm sido reanimados.). A leitura tive é correta.9 Certos intérpretes substituem gozo por “graça” (charan); a diferença está em apenas uma letra grega. Consolação é tradução de parakeleo (Jo 14.16), e significa força, fortalecimento, encorajamento, “coragem”11 (NTLH). Coração (splangkna) significa as emoções, o ser interior do homem. Foi reanimado (lit., “chegou a uma pausa”) dá a entender que todas as preocupações e tensões diminuíram por sua presença e espírito (cf. 20).

Paulo o chama irmão, porque ambos estão relacionados com o mesmo “irmão mais velho”, Cristo (Rm 8.16,17 O Espírito mesmo testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus; 17 e, se filhos, também herdeiros; herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo, se é certo que com ele padecemos, para que também com ele sejamos glorificados.). O espírito de Filemom que maravilhosamente se espelha em Cristo é a causa do louvor e oração de Paulo.

Um escravo se converteu pelo ministério de Paulo em Roma. O apóstolo não tem o direito de ficar com ele ou de enviá-lo a outro lugar senão ao seu legítimo dono. O escravo tem de voltar. O que fará Paulo? O seu problema é, pelo menos, triplo: 1) Paulo tem em mãos propriedade pertencente a outra pessoa e ele tem de dispô-lo conforme os princípios cristãos. Neste caso, a propriedade é um ser humano, um escravo (16). 2)Paulo é guiado pela cultura dos seus dias. Ele é responsável pelo direito civil que reconhece e protege a instituição da escravidão. 3) Por outro lado, ele vive e ensina um modo cristão mais sublime, que rejeita è elimina todos os preconceitos na koinonia cristã (Ef 6.8; Cl 3.11).

1. O Pedido Feito (8-12) Paulo pede a Filemom que ele receba Onésimo como membro da comunhão cristã, porque ele, pela fé em Cristo (10; Cl 4.9), se tornou irmão cristão. Pelo que (8) indica que Paulo acredita que Filemom lhe atenderá ao pedido satisfatoriamente. Ele o elogia por seu espírito maravilhoso, e agora conta com a continuação dessa mesma atitude. Paulo poderia ser audaz e mandar (“ordenar”, BAB, BJ, RA) por causa do seu apostolado, mas ele não apela para essa autoridade (cf. 1). Ele prefere pedir (9; “solicitar”, AEC, RA).

O apóstolo usa sua posição com critério. Paulo trabalha por caridade, ou seja, “baseado no amor” (BAB; cf. NVI; ou “em nome do amor”, AEC, RA) e não por coerção. Ele gosta de persuadir em vez de mandar (quantas vezes as pessoas se servem da força e coerção para alcançar os fins propostos, quando são muito inaptas para persuadir!). O que... convém significa aquilo que é adequado ou apropriado (“o que você deve fazer”, “fazer o que considero ser certo”, CH).

a) Velhice (9b). Paulo é velho (presbutes, “homem velho”).Certa versão bíblica tem a tradução “embaixador” (RSV). Porém, velho se encaixa mais adequadamente ao tom da carta, levando em conta o versículo anterior, no qual ele nega o uso de sua autoridade apostólica (Ef 6.20). Nessa época, Paulo tinha provavelmente 60 anos de idade.

b) Prisão (9c, 10). Paulo é prisioneiro por causa da sua fé em Jesus Cristo (9). Enquanto estava encarcerado, ele gerou um filho (10), metáfora que indica que ele ganhara um convertido (cf. G14.19). Pedro escreveu que Deus também gera (1 Pe 1.3). Apelando a Filemom, Paulo pede solidariedade por seu filho, visto que o apóstolo não pode libertá-lo para o serviço do Senhor. Em certos manuscritos, não ocorre a palavra grega traduzida por minhas.

c) Transformação (11). “Onésimo” (10) significa útil, “proveitoso”, “benéfico” (cf.14,20). Agora pela primeira vez ele é útil. O significado do nome é, agora, o seu caráter. A passagem de Colossenses 3.22,23 mostra por que ele será útil para Paulo e Filemom. d) Intimidade (12). Eu to tornei a enviar (11, anapempsa) está no aoristo epistolar e deve ser traduzido no tempo presente: “Mando-o de volta a ti” (12).

Significa reenviar para julgamento, assim como o prisioneiro é devolvido a outro tribunal (Lc 23.7,11; At 25.21). Paulo mantém-se fiel ao seu dever. Torna a recebê-lo como ao meu coração é o mesmo que dizer “receba-o como a mim, como minha descendência”. A relação é afetuosa e íntima. E eles não oraram, sofreram, choraram e cantaram juntos? Temos esta opção tradutória: “Mando-o de volta a ti, a ele que é o meu coração” (AEC). 2. A Resposta Esperada (13,14)
Paulo conta que surja em Filemom a mais sublime bondade por livre e espontânea vontade. Eu bem o quisera conservar comigo (13) é imperfeito, pois indica propósito parcial, auto deliberação. Com as palavras por ti (“em teu lugar”), Paulo dá a entender uma dívida que Filemom lhe devia (cf. 19b). Nas prisões do evangelho é igual a “nas prisões de Cristo” (cf. I).18 Parecer (14) é o mesmo que “consentimento” (AEC, BJ, BV, RA). Os benefícios são recíprocos, tanto para Paulo quanto para Filemom, bem como para Onésimo. Mas Paulo esperava que a decisão de Filemom fazer o que é certo brotasse de seu interior espontaneamente e não por necessidade.

Propostas, 15-22.

A solução que Paulo oferece ao seu problema é quádruplo.

1. Restituição (15) Se tenha separado está realmente na voz passiva e deve ser traduzido por “tenha sido afastado”. Declarado deste jeito, a palavra dá a entender a providência divina na fuga de Onésimo. Rm 8.28. Tempo é, literalmente, “hora”, significando curto período. O termo grego aionion (para sempre) significa “definitivamente”, “permanentemente”. Paulo pede, então, que Filemom restitua Onésimo à comunhão pessoal e definitiva.

2. Elevação (16,17) Paulo não nega o fato da escravidão, nem busca destruí-la às claras, mas a eleva a uma nova dimensão de relação livre e responsável.20Ele sugere que Onésimo seja considerado irmão amado (16), quer dizer, cristão (Rm 8:29; 1 Co 5.11). Embora a maldição da escravidão um dia acabe, a lei do serviço e trabalho nunca deve ser ab-rogada (Ef 5.21; 1 Ts 3.8-10).

Muitos querem que a lei do trabalho seja revogada para procurarem assistência social e doações em roupas e alimentos, mas as Escrituras ensinam a lei do serviço responsável. O cristianismo soluciona o problema da escravidão, quando soluciona o problema da tirania.21Os benefícios serão de ambas as partes — de mim e... de ti — e do escravo também (cf. 11). Não devemos entender na carne em sentido literal. Significa bênçãos materiais da mesma forma que no Senhor significa bênçãos espirituais.

Como é importante a expressão no Senhor! Escravidão, degradação de mulheres, infanticídio, guerra, imoralidade são situações que acabam quando as pessoas se unem a Cristo.

Companheiro (17) é derivado da mesma palavra grega traduzida por comunhão cristã (koinonia). Paulo declara que o seu papel e o de Onésimo seriam trocados, por estarem tão estreitamente unidos no serviço de Cristo. O apóstolo também vê o potencial em Onésimo. Inácio o chama bispo, fato que pode ser “sequela espetacular surgida muitos anos depois da carta de Paulo”.22 Levando em conta o texto de Colossenses 4.1, entendemos que Paulo está insinuando a libertação do escravo.

3. Substituição (18,19) A restituição por erros cometidos é exigência necessária para relações certas com Deus e com o homem. O elemento extraordinário aqui é a atitude totalmente cristã do apóstolo (Ex 32.32). Paulo é o bom samaritano (Lc 10.33). Ele se oferece para pagar as contas em aberto. Põe (18, elloga) é igual a “impute”. O apóstolo presume o mesmo espírito que Cristo tem para com os pecadores (Cl 2.14). Eu, Paulo, de minha própria mão o escrevi (19) torna a promessa um contrato. Paulo sugere gentilmente que, se a dívida for lançada em sua conta, então já está cancelada pelo que Filemom lhe deve por ele ser seu pai espiritual.

4. Confiança (20-22) Eu me regozijarei de ti no Senhor (20) foi traduzido por “que eu receba de ti, no Senhor, este benefício [onaimen]”, desta forma havendo alusão ao nome de Onésimo.24 Reanima (20) significa “encoraja” (cf. “dá este conforto”, BJ) e é paralelo ao versículo 7. No Senhor significa que a alegria que Paulo deseja é a satisfação espiritual.

Escrevi-te confiado na tua obediência (21; “certo da tua obediência. Sua proposta é a continuação da confiança que ele tem em Filemom ao longo dos anos. O apóstolo está convencido da obediência (Rm 5.19) de Filemom, ou seja, da sua lealdade para com o Senhor. O significado literal é que ele “lhe atenderá”. Ainda farás mais do que digo dá a entender a possível libertação do escravo.

Paulo está tão confiante na continuação da amizade, que ele pede pousada (22; “quarto de hóspedes”,), provavelmente na casa de Filemom, embora ele não fale especificamente. Paulo também declara a confiança nas orações de Filemom, porque ele espera que, por elas, vos hei de ser concedido, ou seja, liberto da prisão (cf. “eme permita logo ir até aí”,). Estar em circunstâncias adversas pela vontade permissiva de Deus não requer resignação servil. O crente em tais circunstâncias intercede a Deus por tempos melhores e mais oportunidades.

Nos versículos 23 e 24 estão a saudação de alguns dos companheiros de Paulo. Estes associados são os mesmos mencionados em Colossenses, com a exceção de Justo (ver comentários em Cl 4.7-14).

Aqui, Epafras é chamado companheiro de prisão (23). A referência pode ser à prisão física ou significa aprisionado por Cristo. Em Colossenses, ele é chamado “conservo” (Cl 1.7) e “servo de Cristo” (Cl 4.12). Paulo concede a habitual bênção da graça (25) a Filemom e seus amigos. Vosso espírito deveria estar no plural.

Aqui, a graça é de nosso Senhor Jesus Cristo (cf. 3). Paulo é mestre em argumentar e convencer. Ele entende a psicologia das relações humanas. Repare como ele aborda a liderança e o exercício da autoridade. O apóstolo aprendeu do seu Senhor (9) que a moralidade que conta não é por compulsão, mas por espontaneidade. A verdadeira comunhão existe onde homens livres servem uns aos outros para a glória de Cristo (Rm 12.1-8; Ef 5.21).

Se, por vezes, Paulo parece autoritário e dogmático, esta atitude surge, não do sentimento de superioridade (1 Co 15:9; Ef 3.8), mas porque ele está plenamente convicto da probidade do significado e significação do evangelho que ele proclama (G11.8,9). Também devemos manter em mente que os princípios de Paulo se aplicam primariamente à comunidade cristã, a koinonia. Os descrentes e não convertidos nunca conseguirão viver neste patamar das relações humanas, exceto após serem transformados pela graça divina (2 Co 5.17). O trabalho da comunidade cristã — caso esta deseje que o Reino de Deus venha à terra — é convencer o mundo a entrar na nova vida em Cristo.

Conclusão: Nossa tarefa é “demonstrar a todos qual seja a dispensação do mistério” (Ef 3.9 e demonstrar a todos qual seja a dispensação do mistério que, desde o princípio do mundo, esteve oculto em Deus, que criou todas as coisas por meio de Jesus Cristo,) deste novo caminho. E a este propósito que Paulo e a igreja cristã estão comprometidos.









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